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40% dos casos de Alzheimer podem ser evitados com os hábitos de vida

Problema acomete 1,8 milhão de brasileiros

Publicada em 17/07/2023 as 08:32h por Redação O Sul
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 (Foto: Reprodução)

Após décadas de insucessos, a ciência médica começa a colher os primeiros avanços reais contra a doença de Alzheimer. O medicamento Leqembi, recém-aprovado nos EUA, é um deles, mas não o único. Muitos outros estão sendo apresentados em Amsterdã, na Conferência da Associação Internacional de Alzheimer (AAIC, na sigla em inglês), o maior e mais importante congresso sobre doença de Alzheimer e outras demências, com 5.500 trabalhos inscritos e mais de 8.500 participantes, presencial e remotamente.

O coordenador científico da AAIC, o neurocientista Sérgio Ferreira, é professor titular dos Institutos de Biofísica e de Bioquímica Médica da UFRJ, além de pesquisador do IDOR e membro da Academia Brasileira de Ciências. O cientista traça um cenário sobre o futuro do combate da doença. Acompanhe os principais aspectos da entrevista.

1. Qual a dimensão do Alzheimer no Brasil? Temos 1,8 milhão de brasileiros com a doença e, no ritmo em que nossa população tem envelhecido, em alguns anos, serão de 4 milhões a 5 milhões os afetados.

2. E no mundo? Há 50 milhões de casos e esse número praticamente triplicará até 2050. O aumento não será linear. A Europa já está perto do teto e tem investido em prevenção. Veremos boa parte desse crescimento de casos na América Latina, em países como o Brasil.

A doença de Alzheimer até agora não tem cura, mas tem crescido os dados positivos sobre prevenção. Até que medida ela pode ser evitada?

Sabemos que apenas 2% dos casos têm causa hereditária. Nos demais, fatores genéticos trazem riscos, mas não são determinantes. E fatores associados à qualidade de vida que aumentam enormemente o risco, como diabetes, tabagismo, a falta de atividade física e a baixa escolaridade. Estimamos que nada menos do que 40% dos casos de Alzheimer não hereditários poderiam ser evitados com mudanças no estilo de vida e medidas médicas, como o controle da obesidade, do diabetes e da depressão.

3. O senhor costuma dizer que há um componente social muito importante. Por quê? Sim. Existe desigualdade no risco. Porque muitas pessoas não têm acesso à atividade física, por exemplo. Como quem mora numa comunidade afetada pela violência pode pensar em caminhar? Que tempo tem para se exercitar quem passa horas por dia no transporte indo e vindo do trabalho? O custo da comida de qualidade é outro fator. O Brasil está ficando velho e precisa se mobilizar.

4. O que realmente se pode esperar de uma droga como a leqembi? Ela não vai curar nem impedir que a doença se manifeste. Mas os testes até agora sugerem que pode reduzir o declínio cognitivo como nenhum outro remédio até agora conseguiu. E isso é muito.

Os primeiros medicamentos contra o Alzheimer, os inibidores de acetilcolinesterase, ainda hoje em uso, surgiram nos anos 1990. Eles atenuam um pouco o declínio cognitivo, mas não interrompem o curso da doença nem funcionam em metade dos pacientes. A classe seguinte, a da memantina, deu resultados melhores, mas longe de serem satisfatórios. Nos últimos 20 anos se tentou uma série de coisas e nada parecia dar bons resultados. Uma outra droga, o aducanumab, foi lançada nos EUA em 2022, mas foi resultado de muita pressão sobre a Administração de Drogas e Alimentos (FDA) para a liberação de um novo medicamento. O painel científico havia votado contra. Agora as coisas começam a melhorar, a ter mais êxito e o Leqembi faz parte disso.

5. Qual a diferença? O lecanemab (Leqembi é o nome comercial) é um anticorpo que, como outras drogas ataca a proteína beta-amiloide, que se acumula e forma placas no cérebro dos doentes de Alzheimer. Os demais anticorpos até agora se grudavam nas placas. As placas são como lixões, não adianta muito atacá-las. O lecanemab atua sobre as formas solúveis de beta-amiloide, aquelas que estão livres, em circulação no cérebro. Com isso, pode impedir que a beta-amiloide prejudique as conexões cerebrais e, dessa forma, o declínio cognitivo.

6. Quando deve chegar ao Brasil? Não deve demorar, mas são necessários testes clínicos aqui. É uma droga melhor que as demais aprovadas até agora, mas ainda não é a solução.

7. Como os anticorpos poderiam melhorar? Um dos problemas é fazê-los chegar ao cérebro. Uma forma é injetá-los na circulação sanguínea, mas só uma pequena parte consegue vencer a barreira hematoencefálica e de fato chegar ao cérebro. Outra, muito invasiva, é injetar direto na cabeça. O meu grupo de pesquisa investiga formas mais eficientes e em animais tivemos bons resultados.

8. Que forma é essa? É ensinar os neurônios a produzir o próprio remédio. Fazemos isso colocando a sequência genética do anticorpo num vírus inofensivo, no caso um vírus adenoassociado. Ele infecta os neurônios, inoculando neles a receita para fazer o anticorpo. Em animais, os resultados são bons. Temos uma patente nos EUA. Mas precisamos de um parceiro da indústria para levar os testes adiante.




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