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Laudos não identificam veneno e apontam causa indeterminada em mortes de gêmeas no RS

Reportagem teve acesso com exclusividade aos documentos analisados pelo Instituto Geral de Perícias (IGP). MP afirma que mantém entendimento de que a mãe teria matado as filhas. Mulher está presa preventivamente

Publicada em 07/02/2025 as 06:36h por Por Pedro Trindade, Vítor Rosa, g1 RS e RBS TV
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 (Foto: Reprodução)

As perícias realizadas nos corpos das gêmeas encontradas mortas em um intervalo de oito dias em Igrejinha, cidade a 90 km de Porto Alegre, não identificaram veneno nos restos mortais das irmãs. A reportagem teve acesso, com exclusividade, aos documentos analisados pelo Instituto Geral de Perícias (IGP). A mãe das crianças, Gisele Beatriz Dias, é ré e está presa preventivamente.

 

 

Foram testadas mais de cem substâncias químicas no sangue e restos mortais das vítimas — como rins, pulmões e cérebro. Os exames foram feitos para tentar identificar a presença de medicamentos sedativos, pesticidas e venenos, como o arsênio. Todos deram negativo.

 

 

A única substância encontrada foi formol, mas os peritos anotam que é comum o uso para o armazenamento de cadáveres e não há relação com as mortes. As diligências foram cumpridas a pedido da Polícia Civil, que tinha a hipótese de envenenamento como principal suspeita das duas mortes.

 

 

De acordo com o laudo pericial, Antonia Pereira e Manuela Pereira, de 6 anos, tiveram mortes de "causa indeterminada". Os profissionais realizaram análise toxicológica em sangue e em material biológico, coleta de material papiloscópico, pesquisa de álcool, sêmen e venenos, além de exames histopatológicos – de células ou tecidos.

 

 

"O conjunto de dados não permite à presente perícia estabelecer a causa mortis", pontuam os peritos sobre o caso de Antonia.

 

 

As análises realizadas nos restos mortais de Manuela Pereira após a exumação do corpo apontaram que as pesquisas de psicotrópicos e de veneno foram negativas. Um primeiro laudo, antes da realização do procedimento, indicava que a causa da morte teria sido insuficiência respiratória.

 

 

"Do examinado e exposto, conclui-se que, devido ao estado de putrefação do corpo, não há elementos para afirmar ou negar a existência de patologias que possam ter causado o óbito. A causa da morte resta indeterminada", diz trecho do documento.

 

 

Gisele Beatriz Dias, mãe das gêmeas, virou ré na Justiça e é acusada de assassinato das filhas. A denúncia do Ministério Público (MP) foi aceita pela 1ª Vara de Igrejinha no dia 16 de janeiro.

 

 

O MP reafirmou nesta quinta-feira (6) que "mantém a mesma convicção [de responsabilidade de Gisele sobre as mortes], ainda que os laudos não tenham conseguido confirmar qual substância eventualmente foi utilizada". (Veja a manifestação abaixo)

 

 

Na denúncia, o órgão apontou veneno, remédio ou sufocamento por objeto macio como hipóteses para as causas das mortes, mas reforça a "inexistência de causas naturais".

 

 

O advogado José Paulo Schneider, que representa a ré, sustenta que "sem prova do envenenamento, com uma necropsia que não afasta causas naturais, esse processo deve ser trancado e a minha cliente imediatamente solta". 

 

 

 

 

 

 

 

 

Laudo indicou resultados negativos para dezenas de substâncias nos restos mortais de gêmeas — Foto: Reprodução/IGP

 

 

 

 

 

 

 

Análise em computadores, celulares e na casa

 

 

O trabalho de investigação do caso também incluiu a análise de computadores, celulares e chips, e da casa onde moravam as gêmeas. Veja abaixo as conclusões dos peritos:

 

 

HD, SSD e Pendrive: "No material periciado não foram encontradas evidências digitais relacionadas ao caso em tela".

 

 

Celulares, chips e cartão de memória: "Conforme resultados dos exames, não foram localizadas pesquisas nem conversas relacionadas com envenenamentos. Existem algumas pesquisas e conversas relacionadas com os termos de interesse identificados no ofício, cujos trechos foram transcritos no corpo deste laudo, mas nenhuma delas aparenta ter relação com o fato investigado"

 

 

Casa: "Não foram constatados vestígios de violência às vias de acesso, tampouco rupturas, desordem ou desalinhos significativos de coisas e/ou objetos, característicos de luta intensa ou de busca intensa no local"

 

 

A denúncia coloca Gisele como única responsável por um duplo feminicídio, que geralmente é categorizado assim em crimes no contexto de relacionamentos afetivos. A ré responde, também, por meio cruel, outra qualificadora que aumenta a pena em caso de condenação.

 

 

Para a Promotoria, os assassinatos "foram praticados contra mulher, por razões e condições do sexo feminino, em situação de violência doméstica e familiar, por ascendente contra descendentes, e, ainda, contra menores de 14 anos de idade".

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Provas da polícia

 

 

O inquérito que apurou o caso das gêmeas traz como um dos indícios um relatório de buscas enviado pelo Google à polícia após determinação judicial. A investigação foi concluída em 10 de dezembro.

 

 

Ele indica que a mãe das meninas fez buscas para descobrir se "veneno de rato é capaz de matar um ser humano".

 

 

As pesquisas, segundo o inquérito, teriam sido feitas nos dias 10, 11 e 12 de janeiro de 2024 e depois apagadas do celular. As gêmeas foram encontradas mortas em 7 e 15 de outubro do mesmo ano.

 

 

O sumiço repentino do registro de uma câmera de segurança que registrava o movimento da casa também é elencado como comportamento suspeito da mulher. Segundo o inquérito, Gisele disse ao marido que, dias antes da morte da primeira menina, um bandido furtou da casa dinheiro, devolveu no dia seguinte, mas levou consigo o cartão de memória que guardava as imagens.

 

 

O delegado entendeu que isso foi "uma conveniente maneira de Gisele não ter suas ações filmadas no local enquanto seu marido trabalhava fora nos dias imediatamente anteriores à morte de Manuela".

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Relembre o caso

 

 

Manuela Pereira foi encontrada desacordada em casa, onde estava com a mãe, em 7 de outubro. Ela foi levada para o hospital, onde já chegou morta. A suspeita inicial era de infarto.

 

 

Oito dias depois, em 15 de outubro, Antônia Pereira foi encontrada também desacordada em sua cama, onde antes estava dormindo. O Corpo de Bombeiros atestou o óbito no local.

 

 

A partir do segundo caso, a polícia suspeitou do comportamento da mãe. Os indícios foram reforçados após um médico relatar que ela falou ter "ideias perversas" em relação às filhas durante o período em que esteve internada na ala psiquiátrica para tratamento de um quadro de depressão profunda, semanas antes das mortes.

 

 

O depoimento do profissional de saúde levou a polícia a pedir a prisão temporária da mãe, que foi detida enquanto prestava depoimento em 15 de outubro.

 

 

Além do médico, o depoimento da filha mais velha de Gisele, irmã das gêmeas, também reforçou as suspeitas da polícia. Ela disse que a mãe seria "plenamente capaz" de matar as irmãs.

 

 

Gisele segue presa, agora preventivamente.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Nota da defesa de Gisele

 

 

A defesa técnica da acusada, por ocasião da juntada dos laudos realizados pelo IGP, vem a público manifestar o que segue:

 

 

Os diversos laudos juntados pelo IGP confirmam aquilo que a defesa tem dito desde o início: não há qualquer elemento científico que comprove a hipótese de morte por envenenamento ou intoxicação.

 

 

Que fique claro, o laudos do IGP afastam essa hipótese.

 

 

Foram testadas centenas de substâncias e absolutamente nada foi encontrado no sangue das meninas. Ou seja, elas não foram envenenadas e tampouco intoxicadas.

 

 

Todavia, o MP segue afirmando que as meninas foram intoxicadas ou envenenadas. O que o MP está fazendo é brigar com a ciência.

 

 

Em relação a Antônia, aliás, a necropsia, anexada só agora, afasta a morte por hemorragia pulmonar e não descarta que tenha sido decorrente de causas naturais. Trata-se de uma prova técnica que rechaça completamente a absurda afirmação contida na denúncia do MP de que as causas das mortes da Manuela e da Antônia foram em circunstâncias idênticas.

 

 

Insiste-se a necropsia da Antônia afasta completamente a narrativaacusatória. E, mesmo assim, a minha cliente está presa, sem qualquer prova de que as meninas tenha sido assasinadas.

 

 

Passou da hora de os agentes públicos tratarem o caso com responsabilidade e aplicarem a lei.

 

 

Sem prova do envenenamento, com uma necropsia que não asfata causas naturais, o processo deve ser trancado e a minha cliente imediatamente solta.

 

 

Além disso, é fundamental que o delegado de polícia explique por qual razão indiciou minha cliente e enviou o inquérito à justiça sem a necropsia da Antônia, que foi feita ainda no dia da morte.

 

 

Esse documento, que afasta por completo as teses esdrúxulas defendidas por ele e pelo promotor de justiça, está pronto desde o dia da morte e foi juntado só agora. Por quê?

 

 

Consigna-se, por fim, que está na hora de a lei, a ciência e a medicina serem levadas a sério. Esta defesa não medirá esforços para que isso ocorra e que as eventuais arbitrariedades e ilegalides cometidas contra Gisele sejam apuradas e responsabilizadas.

 

 

 

 

 

 

 

 

Nota do Ministério Público

 

 

O Ministério Público do Rio Grande do Sul mantém a mesma convicção, ainda que os laudos não tenham conseguido confirmar qual substância eventualmente foi utilizada.

 

 

As razões de fato e de direito constam perfeitamente explicitadas na denúncia, que contém uma série de outros elementos veemente e fortemente comprobatórios das mortes violentas, dolosa e intencionalmente provocadas. Para o MPRS não há dúvidas da prática criminosa.

 

 

 




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