Em carta escrita um dia antes de ser morto no Complexo Prisional de Canoas, o preso Jackson Peixoto Rodrigues, conhecido como "Nego Jackson", pediu transferência do local temendo "alguma falha na segurança". A existência do documento foi confirmada pelo governo do estado. Cinco servidores foram afastados, incluindo o funcionário que recebeu o pedido e o diretor da penitenciária.
O documento que foi obtido, Jackson se dirige, em terceira pessoa, ao diretor da Penitenciária Estadual de Canoas (Pecan).
"Solicita que seja dada uma atenção de extrema urgência, porque, como é sabido de todos, o requerente é inimigo histórico desse grupo. E, pelo fato de permanecer tão próximo e teme em haver alguma falha na segurança, pede que seja dada esta atenção", disse Jackson na carta.
O advogado de Nego Jackson, Cassyus Pontes, foi procurado pela reportagem sobre a carta e os procedimentos feitos para seu cliente antes da morte.
O preso ainda disse, em documento, que era separado apenas por uma portinhola de outros apenados, inimigos da organização criminosa da qual Jackson fazia parte. Foi justamente através da portinhola que foram efetuados os disparos que atingiram o detento.
"O requerente só quer cumprir seu tempo de pena sem nenhuma alteração no percurso, porém não quer virar uma vitima do estado que está subestimando em colocar inimigos de grande rivalidade no mesmo espaço físico", afirmou.
Em outro trecho, Jackson reclamou por ter sido transferido de uma penitenciária de alta segurança, em Charqueadas, para um presídio de média segurança, em Canoas. O detento disse que, por isso, existia o risco de ingresso de armas no local. A polícia suspeita que um drone tenha sido utilizado para deixar a pistola 9 milímetros utilizada no crime.
O vice-governador Gabriel Souza (MDB) afirmou que ficou sabendo da existência da carta na segunda-feira (25).
"De fato, houve um documento manuscrito pelo apenado entregue a um agente da Polícia Penal que está sendo afastado neste anúncio que faço agora (...). Essa carta teria sido entregue ao seu advogado, ao advogado do apenado. Portanto, é a informação que temos. Não conhecemos o teor da carta", relatou Souza.
Servidores afastados
O anúncio dos afastamentos foi feito na tarde desta segunda-feira (25), no Palácio Piratini, sede do Executivo gaúcho, em Porto Alegre. Como o governador Eduardo Leite (PSDB) está em viagem à Ásia, coube ao vice se pronunciar.
"Estou determinando aqui, como governador do estado em exercício, o afastamento de cinco servidores do Complexo Penitenciário de Canoas, cujas funções são: dois supervisores de turno, um chefe de segurança do complexo, o responsável pela segurança da galeria no momento do crime e também o diretor do Complexo Prisional de Canoas", disse Souza.
De acordo com Gabriel Souza, a medida visa garantir uma apuração isenta do caso. Tanto a Superintendência de Serviços Penitenciários (Susepe) como a Polícia Civil vão investigar o assassinato no presídio.
"Isso não é por qualquer tipo de confirmação ou crenças do governo e culpabilidade de qualquer um desses servidores. Mas no sentido de buscar uma apuração isenta, uma apuração rigorosa, uma apuração também, na medida do possível, que seja célere", afirmou o governador em exercício.
Ao fim das investigações, "a depender dos resultados, eles podem tranquilamente retornar às funções", considerou Souza.
Arma teria ingressado por drone
Conforme a Secretaria de Sistemas Penal e Socioeducativo, a suspeita é de que a arma que matou Jackson tenha ingressado no presídio através de um drone. Na madrugada anterior ao episódio, houve registro de sobrevoo na região.
"A galeria tem sofrido constantes tentativas de entregas de ilícitos por drone, sendo interceptado pelos agentes. Na madrugada anterior ao fato, houve um registro de sobrevoo de drone, momento em que servidores revistaram a galeria e retiraram um rádio e drogas", disse a pasta.
A arma utilizada no ataque dentro da cadeia, uma pistola 9 milímetros, foi apreendida. A Polícia Civil abriu um inquérito para apurar as circunstâncias do crime. No fim de semana, dois supostos responsáveis pelo ataque foram identificados.
Quem era o preso morto
O preso morto dentro da cadeia foi identificado como Jackson Peixoto Rodrigues, de 41 anos. "Nego Jackson", como era conhecido, era apontado como chefe de uma organização criminosa do RS. A arma teria ingressado no interior do presídio através de um drone.
De acordo com o Comando de Policiamento Metropolitano, Jackson tem ligação com 29 homicídios. São assassinatos, com decapitações e esquartejamentos, em que ele teria participação como mandante ou executor. A lista de antecedentes criminais do homem ainda inclui tráfico de drogas, lavagem de dinheiro e associação criminosa.
Em 2017, "Nego Jackson" foi preso pela polícia do Paraguai. Ele foi capturado na cidade de Pedro Juan Caballero com outros três comparsas. Na ocasião, o chefe de polícia do RS declarou que o criminoso era o procurado número 1 do estado.
Jackson deu entrada no presídio federal de Porto Velho (RO) e pediu para ser recolhido no espaço destinado aos presos vinculados a uma organização criminosa do Rio de Janeiro. Conforme as investigações da época, ele tinha vínculo com um traficante de drogas que também estava preso no local.
Em 2020, Jackson foi transferido para o RS. O trâmite contou com escolta reforçada e aparato de segurança para a chegada dele no Aeroporto Salgado Filho. Do terminal, foi levado até a Penitenciária de Alta Segurança de Charqueadas (Pasc).