O Ministério da Educação bloqueou R$ 500 milhões em verbas do Pé-de-Meia apenas três dias após anunciar a expansão do programa. O Pé-de-Meia paga uma bolsa a 4 milhões de estudantes como incentivo para que concluam o ensino médio. O bloqueio de verbas do programa faz parte da contenção de despesas decretada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) na semana passada. Apesar da medida, o MEC afirma que o Pé-de-Meia “não sofrerá qualquer alteração”.
O governo impôs uma contenção de R$ 15 bilhões no Orçamento para tentar cumprir as metas fiscais deste ano. Nesse total, o quinhão do Ministério da Educação será de R$ 1,3 bilhão, dividido entre R$ 1 bilhão de bloqueio (para cumprir o limite do arcabouço fiscal, em função do aumento de gastos obrigatórios, como os benefícios da Previdência Social) e R$ 279,3 milhões de contingenciamento (para cumprir a meta de resultado primário, por causa da arrecadação federal menor que a esperada). Na prática, seja bloqueio ou contingenciamento, significa que esse dinheiro não poderá ser usado.
Esse bloqueio, logo após o anúncio de uma ampliação do programa, expõe mais uma divergência entre necessidades econômicas do governo e as prioridades políticas. Ao participar do anúncio de expansão do programa, na semana passada, Lula destacou o valor que destina para a área. “Enquanto puder colocar dinheiro na educação, é proibido qualquer ministro utilizar a palavra ‘gasto’. Educação é investimento, investimento e investimento.”
Pesquisa Ipec de abril mostrou que, de 8 áreas da gestão, apenas a educação apresentava, por parte dos entrevistados, mais avaliações positivas do que negativas – sobretudo entre os jovens. Por isso, a aposta no Pé-de-Meia, que tem apoio de estudantes, especialistas e do Conselho Nacional de Secretários de Educação.
Uma pesquisa Quaest, de maio, também apontou aprovação de 54% ao programa, que ficou atrás apenas de Farmácia Popular, Bolsa Família e Desenrola (de renegociação de dívidas). O primeiro pagamento da bolsa aos estudantes ocorreu em março. Depois disso, o governo decidiu investir na ampliação do Pé-de-Meia.
Na sexta-feira (2), no Ceará, ao lado do ministro da Educação, Camilo Santana, o presidente afirmou que não faltariam recursos para a ampliação do programa. Lula disse ainda que políticos e o Ministério da Fazenda só trabalham sob pressão. “Eu falei: ‘Vamos encontrar uma solução. Se não tiver dinheiro, vamos lá para o Dario (Durigan, secretário executivo da Fazenda). Se ele reclamar, vamos forçar. Porque tanto político, presidente, quanto o Ministério da Fazenda, só trabalha com pressão’.”
Funcionamento
O programa paga por ano dez parcelas de R$ 200 para estudantes de baixa renda que não deixarem o ensino médio. O dinheiro pode ser sacado a qualquer momento. Além disso, há um depósito de R$ 1 mil por ano, que só podem ser retirados depois da formatura. No total, cada estudante tem direito por ano a R$ 3 mil. Ao final dos três anos de ensino médio, o estudante beneficiado pelo Pé-de-Meia tem direito ainda a um adicional de R$ 200 pela participação no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem).
Metade do bloqueio do Ministério da Educação (R$ 500 milhões) recaiu sobre o programa Pé-de-Meia, que teve 76% do seu orçamento do ano comprometido (o orçamento total do benefício é de R$ 640 milhões previstos em 2024). Procurado pelo Estadão, o ministério disse que ainda estava avaliando as medidas publicadas pelo decreto de congelamento, mas não explicou as escolhas feitas que atingiram o Pé-de-Meia e outros programas. “O MEC mantém articulação constante junto à equipe econômica do governo e seguirá trabalhando para que, com a melhoria do cenário econômico, haja retorno das programações para a execução da pasta”, afirmou a pasta.
O MEC disse que o Pé-de-Meia “não sofrerá alteração”, apesar do bloqueio. “O Programa Pé-de-Meia, assim como sua recente ampliação, alcançando quase 4 milhões de estudantes, está com seus recursos garantidos e, portanto, não sofrerá nenhuma alteração. A indicação orçamentária realizada no Sistema Integrado de Administração Financeira do Governo Federal (Siafi) visa a atender ao Decreto de Programação Orçamentária e Financeira (DPOF) e em nada compromete a execução do programa, uma das prioridades do ministério.”
O valor bloqueado é suficiente para atender 54 mil estudantes, considerando o valor de R$ 9.200 durante todo o ensino médio. Mas é preciso destacar que o programa já contava com recursos reservados (uma espécie de garantia) de R$ 6,1 bilhões, separados do orçamento de 2023.
Na semana passada, quando o governo anunciou a ampliação do programa, não detalhou novos valores investidos. Considerando o custo por beneficiário e o número de novas vagas anunciadas, 1,2 milhão, só essa expansão custaria mais de R$ 3,6 bilhões anuais.