Os assassinatos de Marielle Franco e de Anderson Gomes prolongam, há cinco anos, duas perguntas ainda sem respostas: quem mandou matá-los e por quê? Com a delação de Élcio de Queiroz, em 14 de junho, novos elementos foram revelados, além de integrantes até então desconhecidos, como o ex-bombeiro Maxwell Simões Correa, o Suel, preso na segunda-feira suspeito de participar dos crimes. O depoimento expôs à Polícia Federal e ao Ministério Público esquemas de lavagem de dinheiro, movimentações milionárias, milícias e mortes como queima de arquivo, tudo à espera de explicação.
Entre 12 de março de 2019 e 13 de outubro de 2021, Suel teria feito pagamentos no valor de R$ 567 mil, e recebido R$ 569 mil em sua conta bancária pessoal, segundo um levantamento feito pela PF. Somando, a movimentação é de R$ 1,1 milhão, quantia considerada pelos investigadores como incompatível aos R$ 10 mil mensais como bombeiro — se o suspeito não gastasse nada do salário, acumularia R$ 360 mil em três anos.
Além dessas transações, há também quantias ligadas à empresa Rohden Imports, de Suel, voltada à comercialização de veículos. Para a PF, ela faz parte de um esquema de lavagem de dinheiro, no qual, em apenas três meses, o delator teria movimentado R$ 5,3 milhões.
O levantamento da PF também reforça a ligação de Suel com pessoas presas ou condenadas por estelionato, lavagem de dinheiro, tráfico de drogas e envolvimento com milícias. Entre julho de 2021 e março de 2022, o ex-bombeiro recebeu R$ 142,3 mil de Fábio Marques Nobre de Almeida, ex-policial preso em 2011 e já condenado por participação em grupos paramilitares.
Ele também teria recebido R$ 132 mil de Carla Oliveira de Melo, presa em 2021 por envolvimento com o tráfico de drogas e lavagem de dinheiro, R$ 10 mil de Danilo Destro Furtado, apontado pela PF como estelionatário, e R$ 16 mil da empresa Motors 13, pertencente a Fábio Dutra de Souza, preso por envolvimento na importação irregular de veículos de luxo.
Queima de arquivo
A delação de Élcio de Queiroz trouxe à tona o nome do sargento aposentado da PM Edimilson Oliveira da Silva, o Macalé. Ele foi executado a tiros em novembro de 2021, morte suspeita de ser queima de arquivo sobre o caso de Marielle, e é apontado pelo delator como o intermediário entre o mandante do crime e o ex-sargento Ronnie Lessa, quem assassinou a vereadora e o motorista Anderson.
No passado, Macalé foi citado em inquéritos do jogo do bicho e em acusações de ligação com a milícia. O nome dele aparece na publicação da “CPI das Milícias”, presidida, à época, pelo deputado estadual Marcelo Freixo, de quem Marielle era assessora. Ele foi apontado como um dos integrantes da milícia de Oswaldo Cruz, na Zona Norte do Rio, mas não chegou a ser investigado.
O nome do suspeito também aparece ligado à tentativa de homicídio contra Shanna Harrouche Garcia, filha do bicheiro Maninho, em outubro 2019, e também na morte de Alcebíades Paes Garcia, o Bid, tio de Shanna e irmão de Maninho, em fevereiro de 2020. Macalé nunca foi condenado por nenhum crime.
Mandante
Três nomes de políticos cariocas circulam as mortes de Marielle e Anderson: o ex-vereador Cristiano Girão, preso por envolvimento com a milícia; o conselheiro do Tribunal de Contas do Estado (TCE) Domingos Brazão; e o ex-vereador Marcello Siciliano. Todos foram investigados pela Polícia Civil, e as participações não conseguiram ser comprovadas — nem descartadas. Com a delação de Élcio e prisão de Suel, a PF espera ter mais detalhes sobre os mandantes.
Sobre a motivação do crime, o coordenador do Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado (Gaeco) do MPRJ, Fábio Corrêa, afirmou que, independente de quem mandou matar a vereadora, a razão tem origem nas bandeiras levantadas por Marielle em seu trabalho como parlamentar.